segunda-feira, junho 19, 2006

Feliz

Emaranhados de tronco e folhas
Despojadamente entesouro com a minha tesoura
Corte após corte na carne verde e castanha
A jardineira alma embrenhada nos canteiros

Simbiose de homem ferro lenha
Dão-me cheiro cor sombra
Dou-lhes trabalho
Só a tesoura parece defraudada
Enferruja lentamente e cada dia geme mais

Mestre de Jardim chama-me o azevinho ao picar-me
Coraçãozinho de Jesus as rosas rasgantes
E outros armados em árvore de tão grandes
Fazem chuvas de folhas ainda mal varri

Trepadeira de trombetas vermelhas
Não te conheço nome
Madressilvas como vos conheço o cheiro
Aqueles cactos chatos já sei
Aloé Vera vi num châmpo

Ainda há sardinheiras e uns que são os verdes
E costelas-de-adão ou patas de cavalo, a gosto
E hidranjas ou lá como se chamam, jarros
Uma laranjeira um limoeiro um marmeleiro
E uma árvore da borracha que dá figos
( Viva a Selecção )

No rectângulo de pedra na extrema
Sinto a casa aqui ausente
Um cubo de ar habitado cobre-me
A memória no sítio
O calor que sai das lajes
Tempera-me a sola dos pés
Cozinha-me com festas

Pouso a tesoura e puxo folhas
Folhas após folhas e troncos e areia e pó
Faço montes e vales de verde morto
A pilha cheira a velha dama perfumada
Um odor doce mas usado um pouco demais

Suo não muito mas suo
Chega o momento do vale a pena
E com a mangueira pinto cores frescas nas plantas
A água a avivar-lhes o cheiro
Mais o da terra da pedra de evaporar
Um jardim é um bom sítio para um nariz atento

As plantas parece que murmuram depois de regadas
Sente-se um alívio hídrico e uma dor nas costas
Então o ritual do cigarrinho sob o guarda-sol
E sentir que cinco minutos por dia sou feliz

1 Comments:

Blogger banalidadesdebase said...

Fantastic!
Gloriosos momentos, que ditos a outros soarao provavelmente banais, mas no fundo sao os que emprestam a vida a nossa dimensao toda!

terça-feira, junho 20, 2006  

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