sexta-feira, janeiro 06, 2006

Dois Sonetos

I
De repente solta a língua
A frase breve, o lampejo
No instante do desejo
Mão vazia, alma à mingua

Ter mais do quê
Se nada tenho
De onde venho
Já ninguém vê

Rezo já não a Deus mas a mim
O milagre pertinaz, um brilho novo
Tirar do peito leão, ser sim

Encolho os ombros, gesto coevo
Marca d’água da terra donde vim
E sei que não sou mais que ovo

II

A distante hora que vi luz
Marcou-me a retina verde
Tenho olhos de quem perde
De mim sempre para nós

Mais era o meu mote
Mais de tudo, mais de nada
Havia razões de muda
Mas meu navio era bote

Plantado numa beira-mar escassa
Sou duna mar e céu e este é cinza
A vontade de ir morreu

Erguido ao vento gélido sou eu
O fruto destas raízes é meu
Monumento singular à tristeza

2 Comments:

Blogger Mãe said...

Lindo. Lindos.
Que o fruto dessas raízes seja sempre teu, mais amargo no inverno, doce quando o calor o envolver...mas teu. Que esses frutos tenham o "hálito indefinível do ritmo íntimo das seivas" de que falava Pessoa ...e já agora...que possamos escolher quando os colher...numa ténue, muito ténue nesga de livre-arbítrio :)

sábado, janeiro 07, 2006  
Blogger Lagoa_Azul said...

Sonetos sempre lindo, sempre de encantar, maravilhosas formas de expressar...
Beijos com carinho.

sábado, janeiro 07, 2006  

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