sexta-feira, fevereiro 10, 2006

Amor de Nós ou Ficções à Volta da Esperança ( a S. )

K.581

A ti que não vi ontem
Vai singela esta homenagem
A ti que afinal nunca vi
Sai-me com pena esta imagem

Bela como a noite mais escura
Brilhante como o claro dia
Nunca te vi como ontem
E ontem mesmo não te vi

Cego como sempre afinal
Penso em ti, e não és nada
Senão o que de ti nunca vi
Só a sombra de uma voz

Um clarinete de Mozart
transbordando melancolia
Está assim meu coração
Brilha, brilha a melodia

A ti que afinal não vi ontem
A ti que nunca te vi
Dedico um clarinete
Brilha, brilha a melodia

Ante mim

A ti que hoje já vi
Dedico por ora estas linhas
A ti que me fazes tremer
Falo palavras baixinhas

És como a corrente eléctrica
Ora subterrânea, ora aérea
Fazes-me vibrar
De ambas as maneiras

Debaixo do cabelo
Olhaste para mim
E eu senti-me
Senti-te

A ti que hoje já vi
Espero risonhos futuros
Sê feliz
Que eu sem ti não sou

Declaro!

Se for um dia destino
Cruzar teu rumo, ir
Onde tu fores; mais
Caminhar mas contigo

Se te der nas mãos
O que quiseres de
Mim, não sei quê de
Mim que tu queiras

Se fores eco desta
Voz já fraca, um dia
Vou gritar teu nome
E tu vais ouvi-lo como

Se viesse de ti para ti
Ribombando qual
Trovão fundador de
Fés mais transcendentes

( Que amores pequenos
Já me cansam e tu
És da marca dos amores
Imensos )

Imerso estou eu na
Recordação de ti
Tricotando malhas
De desejo e futuro

Bicolores os resultados
Quando um dia os vestires
Ficarás ainda mais bela
Por isso, abre os ouvidos

E ao me ouvires gritar
O teu nome como quem
Se afoga, salva-me rápida
Da água fria do sem ti

Sentimentos dizemos aos
Vivos quando se lamentam
Ausências perpétuas, não,
Não me-os dês ainda pois

Eu quero um dia cruzar
Teu rumo, passear mão
Na mão o mesmo trilho
Fazer futuro de nós

Eu ainda quero gritar
Teu nome nas praças
E nas ruas e decorar
As minhas recordações

Com os teus olhos, os
Teus cabelos, a maneira
Como te mexes e fazes
Mexer ‘meu coração

Irrequieto. Até lá
Mantém-te atenta às
Andorinhas que já
Quase voltaram, e pede

À Primavera um amor
Novo para dares a quem
To mereça. Eu espero
Aqui, nesta encruzilhada

Por ti à procura de amores
De novas cores para te
Vestir nesta nova estação
Que já não tarda

Declaro! 2

Toma meu rumo. Segue
Este grito escrito e juro
Pelas andorinhas, que
Hei-de fazer por merecer-te

Toma meu rumo e ao
Encontrares-me diz
Baixinho é finda a
Espera amor, é finda

Que quem jura pelas
Andorinhas não é de mentir
É de voar sazonalmente
E de acreditar piamente

Dou-te a cor da primavera
Se a quiseres e o cheiro
Das flores desabrochando
- Toma meu rumo!

Nada

A ti que vi nos meus sonhos
Selvagem e doce nos desejos
Cumpridos não digo hoje mais
Nada

Sonhos não se partilham os
Meus pelo menos não é assim
Como se parte de mim não fosse
Nada

Para ti é suposto partilhar tudo
Como se Fidelidade fosse
Confissão e Profissão de Fé ?
Nada

É mais errado neste amor de
Nós que ainda é só meu sou
Dono e senhor inclusive do
Nada

Que ao acordar te tornaste
Fumo doce incensando o
Meu acordar cansado, o meu
Nada

Sem ti este amor de nós
Vale os meus sonhos e
Vale tanto como se valesse
Nada

Mas nada te direi do
Amor de nós quando
For hora de ires vai
Eu ficarei sempre com
Nada

E se se cumprir este
Amor de nós nada
Te direi da história do
Antes desse amor de nós
Nada

E como a escrevo dia
A dia se tu a leres um
Dia de quem foi S
Para mim nada te direi
Nada!

Acto falhado

Chega o fim deste dia
Marcado pelo engano
O meu e o teu
Coincidências ferozes

Uma semana deserta de ti
Um oásis de voz
Trémula e hesitante
Não reconhecida

Pressentida
Depois confirmada
Era o número de quem?
Há, existem milagres nas estrelas

Celestes os corpos
Vistos por uns e outros
Direcções várias
Afinal não era engano

Ficou um desejo eléctrico
Telefónico e desfasado
Entre ouvir e saber
Entre não ver e ouvir

Fim

A estrada longa
Começada com um passo
O caminho novo
A desbravar como um mato
Metafórico

És destino desta partida
És fonte deste rio
Sabes ao mar amargo da chegada
‘Se eu lá chegar

Estás
Aqui e no fim
És caminho e fim

Ando cego
Seguindo cheiros
De memórias construídos
Mapas que desenho
Em linhas de verso
Em rimas de folhas

Caminho e fim
Se eu lá chegar

És

Só não sei o quê
Apenas te sei motivo de ida
Motor de movimento, destino almejado

Apenas me sei
Indo
Soprado de brisas
Partido de ti para chegar a ti

Estou a meio de nós
Nas minhas costas sinto teus olhos
À minha frente miro teus olhos

Sou
Só não sei o quê
Apenas me sei movido a ti
Motor em movimento, viajante empenhado

‘Se a i chegar
Hás-de cheirar tu mar d’outra maneira

Quado Chegar

Idolatria

Na mulher em que acredito
Moram pedaços de mim
Estátua pobre d’arenito
Frágil como um dia assim

Desabrochado entre o frio
Ai pobre é até de versos
Ai este amor tão vazio
Como de Fé os Conversos

Bate-me este coração quente
Enchem-me imagens de ti
Tenho p’ra mim q’é presente
Só o dia em que te vi

Desde lá c’ando perdido
Sem luz com’ encarcerado
Um vaga-lume iludido
P’la clara manhã voando

Pela noite escura e fria
Ando eu como possesso
Sem motivo d’alegria
Sendo esta dor o compasso

De uma procissão perdida
De andor que não tem santo
Tenha na alma uma ferida
Do tamanho do encanto

Daquela em ‘que me acredito
Piamente e empenhado
Só nela penso e medito
Sou peixe ‘em rede apanhado

Falta aqui falar de esperança
Que de fé já se falou
Espero de ti um futuro
Que no presente já estou

E ‘stás tu sempre comigo
Agarrado estou em ti
És imagem eu bem sei
Mal de mim se me perdi

Que ídolos de pés de barro
Mesmo os de pedra mole
São para carregar como fardo
Não imagem a quem se ‘imole

O cordeiro deste amor
Vou apear teu altar
Faz-me tu só um favor
Proíbe-me de acreditar

Faz-me desta a derradeira
Oração à tua beira
Manda-me lá p’ra bem longe
- Ai do dia em que te vi

Visitação

Relâmpago
Cortaste-me os olhos em luz resplandecente
Ficou trovão o meu coração
Ruído imenso
Em silêncio

Amo normalmente
Como preguiça sonolenta
Subindo lentamente a árvore
Nadando lentamente o rio
Em silêncio

Mas há dias
Diferentes
Acelerados como a luz do sol
Em que os meus olhos piscos
Se enchem de ti
Se abrem em espantos

Tempestade, Tempestade
Arrasas quotidiana os meus telhados
Terramoto nas minhas fundações
‘Só quando te vejo
Turbulenta em teus gestos que imagino

Olhar para ti sem ter por horas
Os relógios do mundo
Saber de ti todo o detalhe
Adorar-te
Fazer de ti a deusa do trovão

Mas não
Prefiro-me vagarosa preguiça
Só eu ocasionalmente cego
Pela luz de teu relâmpago
Lentamente ofuscado
Por teu brilho solar

Por teu imenso ruído
Surdo à esperança
De te ter um dia
Domesticada pelas cercas de mim
Abraçada, tu a Indómita
Por estes braços fracos

Folclore

Sou d’ essência dividido
Minha cara tem dois lados
Passo por mim fronte a ‘espelhos
Minha fronte sem sentido

Em minha cara deserta
Só ‘luz em meus olhos vejo
São diferentes um do outro
Um é ânsia outro desejo

Minhas mãos não estão de acordo
Cada uma tem seu lado
Submetidas nas tarefas
Ao meu coração gelado

Hoje quero ir para lá
Amanhã vou estar aqui
Nunca sei haver destino
Já só sei que te perdi

Que o ‘meu rumo eras tu
Só tu a ‘minha união
Sou como irmão desavindo
Siamês sem opção

Tarda o dia em que te esqueça
Vai chegar tal não duvido
Vou vivendo separado
Esperando enfim olvido

Tarda o dia em que te esqueça
Vai chegar sem opção
Vou vivendo dividido
Gelado de coração

Amanhã meu nome é esperança
Hei-de ver o novo dia
Em que unido enfim renasça
Em que me torne alegria

Adios Muchacha

Tenho hora d’ir embora
P’ra breve está a partida
Se cá ficas não m’importa

Vou correr outro caminho
Versejar outro horizonte
Saudades só do perdido

Adeus digo à luz velada
Em teus olhos pressentida
Guarda-os em boa guarda

Vou-me embora
Velha brisa
Sopra agora sem morada

Vou-me embora
Não me esperes
Já não sei olhar p’ra trás

Vou seguir ledo e ligeiro
Vai-me ‘levar a Nortada
Toma lá este sorriso

Como um adeus derradeiro
Fica porto qu’eu vou barco
Por uma estrada sem marco

Fica aqui à Monumento
Estátua partida de mim
Que eu cá estou já donde vim

Pela estrada caminhando
De assovio no lábio
Trazendo recordação

Daquilo que nunca fiz
Dos teus olhos mui serenos
Dos entardeceres amenos

Que te julgava presente
Que te sonhava comigo
Afinal ‘estavas ausente

E meu coração partido
Fez as malas e fugiu
Trazendo recordação
De ti que nunca te viu

Adeus

Moradores na mesma casa os corações desavindos
Voam pela mesma asa como pássaros perdidos
Vem já lá a Primavera de cores novas vai vestindo
O cadáver deste Inverno que fenece devagar

Frio, muito frio guardo ainda em minhas mãos
E os olhos, esses, aquecem demasiadamente lentos
Vi hoje a borboleta primeira, ontem flores na japoneira
Amanhã quem sabe novos rebentos acordem, ternos

Só tu não mudas, amor, só tu não brotas
Verde de esperanças novas como água de fontes
E me imundas como rio novo, como riso novo
Como vinho em taça cristalina e breve brinde

Eu vou deixar vir a mim a Primavera, amor
Fica-te lá tu pelo teu Inverno defunto
Que eu quero amanhãs mais quentes, sois mais brilhantes
Que eu quero a relva, também verde, a crescer sob meus pés

Sonhei, tu sabes, em nós dois em nó atados
Sabes, morreu-me o sonho com a flor da japoneira
Companheiro perene deste Inverno já cadáver
Vou vela-los vagarosamente com círios brandos

Talvez a luz mais borboletas encandeie
Talvez tu franqueies a passo tímido o limiar da estação
Estarei aqui a receber-te como a irmã passageira
Descida do trem da esperança ao cais futuro

Não esperes é mais de mim que do Inverno que deixares
Que lá morto estás meu sonho
Ficaste-te pelo frio demasiado tempo
Agora já só me aqueço ao sol, às novas cores

Adeus te direi à chegada deste entroncamento
Que mais não têm que duas aves desavindas
Uma buscando o Sul mais brando, outra fugindo o Norte agreste
Voando ainda assim as diferentes direcções

Desencontrei-me de ti por minha culpa
Não fui quem queria ser por falha minha
Adeus então nesta chegada que o atraso
Não foi teu, não foi meu, foi por acaso

( No D.N. de hoje, um CD de Mozart, o Quinteto que inspirou o primeiro destes 12 poemas ( sobretudo o Larghetto ); Feitos há um ano, entre Janeiro e Fevereiro, eram fruto de uma paixão assolapada, que felizmente soçobrou sem consequências nem mágoas; são uma experiência algo falhada, mas que dedico a S. e a Mozart, pedindo desculpa por qualquer coisinha )

1 Comments:

Blogger isabel mendes ferreira said...

p
a
u
l
o......fiquei sem respirar porque respirava debaixo de uma ONDA de S e de Ti....

terei de voltar amanhã e depois de amanhã para "preguiçar" neste mar/vulcão....

e para já, assim só com os olhos da memória dos sentidos, sinto que é
b
e
l
o
.até logo.

.beijos.

sexta-feira, fevereiro 10, 2006  

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