sexta-feira, novembro 24, 2006

Meço Distâncias

Meço distâncias no passo dos olhos oblíquos
Avalio o tempo que sobra pelas folhas que restam
Somo a tristeza em dobro porque é liquida
Vejo o mar e sobraço na noção de costa

Tenho na impressão de nada a certeza concreta
Que pesei a alguém que alguém me amou
Tenho na concreta clareza do dia cinza
A massa da nuvem que por mim passou

Debaixo da minha sombra cresce a alga
No duro dos meus olhos anicha a dor
A mão quieta sabe garra e afago
Na boca seca um sabor amargo

Deixo-me e digo-me um adeus acenado
No intervalo entre mim cresce luz
Parto partido e volto invadido
Pela saudade estranha de me saber todo

A evidência do espelho nega-me a transcendência
O atrito do tacto revela-me a substância
Uma leveza de pena ainda assim pesa
Um fio de escrita amarra-me o corpo

Olho um horizonte absolutamente novo
Com um par de olhos que nunca tive
A revolução quotidiana de ser
Faz de cada dia um inquieto impar

Mais ter mais ser mais ver
Antropófago canibal e omnívoro
Sigo por mim uma linha férrea
Feroz de carril e agulha

Saborear a língua numa travessa de folhas
Ser a lombada de um livro aberto
Eixo de mim trancado em mim
Chove-me Novembro gira o mundo em rodas

Olho a janela os rios de chuva o telhado em frente
Olho as minhas mãos que correm as letras
Vejo o verso e sei-o meu e frio
E desejo um desejo ainda que vazio

2 Comments:

Blogger Sophie said...

Dizem que o paraíso é aqui.
Seja ele qual for.
Seja ele onde for.
E ao contrário de Dante, diante da sua comédia, ele sorri para todos. Sem exigir pressa. Nem promessa. Só educação. Fina. Depurada. Virtude sagrada. Luxo absoluto que nunca sai de moda. Atitude típica de quem leva a vida com glamour. Sem peso. Com consciência. Essência da convivência democrática. Fantasias de um Éden que não exige santidade, apenas verdade. Que entre tantos e incontáveis paraísos desvendados, seja este, em particular, seu.
E tão somente único como deve ser quem se admira.
Com afecto, de certo, inestimável.

Adorei o teu texto, as tuas palavras são vestidas a carácter e repletas dele.

Beijo

sexta-feira, novembro 24, 2006  
Blogger mfc said...

Enquanto vivermos, sempre desejaremos.

segunda-feira, novembro 27, 2006  

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