segunda-feira, dezembro 04, 2006

Da Praia, do Carnaval, do Natal e do Túnel

Tive uma mulher que tinha medo de comboios. Também tinha medo de mim. Há coisas estranhas na vida de um homem. A onda curva sobe a praia no seu som redondo. Um homem cria couraças ao longo da vida. O homem é um tatu, de longas garras e face afilada. Um tronco branco marca a meia praia. Fugir da escolha é escolher. Assim, em cada duas opções há sempre uma terceira. Uma espécie de espírito santo do caminho, só que este convida à passividade o outro à acção, este à indiferença o outro à caridade. A areia muda com o vento e canta tranquila.

Chove sobre mim como tule, lembro Carnavais com véu e álcool, e beijos no pescoço sob penas de índia. Amarro-me sólido à ideia que não mudei porque não foi necessário. Agora na mesma, só perdi tempo. E esse, para mim não vale nada. O imaterial tempo não é um crédito, é uma imersão.

Andei ontem pelas lojas peneirando prendas, os milhares de sorriso uma vez ao ano. Consumir e passear bailando entre as montras e os pinheiros de natal. Dançar perdido um samba-canção. Ouvir Elis a cantar a louvação. Nosso Senhor gosta desta música. Louvando o que bem merece deixa o que é ruim de lado.

O tempo de um adeus é o tempo que se leva a prepará-lo. A vida deu-me calo em despedidas. Ainda dói, mas já não espanta. E a vida é a surpresa. Dizer adeus é um comboio suburbano a entrar em S. Bento. O túnel quase medo, a estação de solidez férrea e já chegamos. Adeus a este, a mais este, adeus. Não sei quem falava de partidas apitadas ( por acaso até sei ); a minha vida é só uma chegada acre.

5 Comments:

Blogger Sophie said...

O que resta do passado é um silêncio rasgado de recordações. Uma melodia que fica.
Por vezes, uma chuva forte perturba este silêncio rasgado em mantos de lembranças.

Um beijo grande

segunda-feira, dezembro 04, 2006  
Blogger Sophie said...

Somos nós, com os nossos passos, que vamos fazendo o nosso próprio caminho. Há quem corra demasiado depressa e perca a alma no trajecto, há quem mude de idéias e arrisque um atalho, há quem não saiba escolher a melhor direcção quando chega a uma encruzilhada, há quem deixe pedras pelo caminho para não se perder, se precisar voltar para trás.

Um beijo

segunda-feira, dezembro 04, 2006  
Blogger alice said...

atenção à composição que vai dar entrada na linha número um. traz um coração para um transplante. o paciente à espera do órgão é a sociedade. obrigada, paulo. um beijinho.

terça-feira, dezembro 05, 2006  
Blogger mfc said...

... o pior é quando são acres os entretantos!

quarta-feira, dezembro 06, 2006  
Blogger maria said...

eu percebo as pessoas que têm medo de comboios! normalmente porque se habituam a vê-los partir, ficando quietas no caminho! :)

quinta-feira, dezembro 07, 2006  

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