Dúvida
Se este dia infindo enfim terminasse
Se fosse agora o já que já não espero
Dúvida
Sempre o enorme Se da dúvida
Será finita a infinita espera
Durará enquanto dure
Não me falta nada
Mas tenho excesso de ausências
Estou farto de ser
Não sei bem o quê
Mas não quero nada
Os sonhos ainda me perseguem
Nesta montaria vaga
Não me sei lebre ou cão
Não me sei
Talvez queira algo, então
Um nome próprio, decente
Uma placa que indique caminho
Uma direcção para as minhas cartas
Talvez seja eu quem persegue os sonhos
Como voos de ave, como brisas cálidas
Mas não quero chegar-lhes
Preso no labirinto, meu fio é curto
Não vou chegar ao fim da história
Não vou saber a cara ao monstro
Sempre o Se enorme da dúvida
Sempre o sonhar novas perguntas
E sempre o não querer nada senão sonhos
Dúvida
Ou a não certeza de estar certo
Ou o não saber errar por não saber tentar
Sonhar
Como única rota para o impossível
Contemplo a ponte sobre o algo assim
A curva qu’ela descreve sobre o algo em mim
E sonho
Não como quem espera, mas como quem sonha
Não como quem faz, mas como quem tenta
Como quem erra
No fim persistirá, não tenho dúvidas
A dúvida
Os meus sonhos d’ontem já não são
Perenes na sua inconsistência
E o erro permanecerá a base
O alicerce dos de amanhã
Metrónomo rápido quando não é lento
Bate o coração os porquês, os sins
Os nãos, os assins
Num ritmo ditado pela voz ausente
Pela regra não escrita
Pelo sonho
Pela dúvida
Bate sinónimo d’ incerteza
E pela certeza de ter de bater
Bate assim, porque sim
E já não duvido que irá parar
Como a ponte que não tem destino
Será meu destino parar de sonhar
Sigo então
Dúvida e sonho
E já tenho nomes próprios, decentes
Lavados e enxutos prontos a vestir
Encolhi a dúvida para o meu tamanho
Alarguei os sonhos para o infinito
Nunca mais duvidarei a lebre
E nunca mais duvidarei o cão
A montaria nunca passou de vaga
Passageira
Dúvida
A palavra certa no momento errado
O verso acabado qu’ainda nos ressoa
A vaga na areia como fim de tudo
Ou o erro enfim como um nome novo